sexta-feira, 2 de julho de 2021

Confisco das aposentadorias: atecnicidade, antidemocracia e vilaniedade.

 

“A religião pura e imaculada diante de nosso Deus e Pai é esta: Visitar os órfãos e as viúvas nas suas aflições e guardar-se isento da corrupção do mundo.” Tiago 1:27.                             

 Após a maior derrota do Governador Mauro Mendes junto ao Conselho de Previdência, um feito histórico, em que a articulação estratégica, nunca antes vista, das representantes dos Segurados venceu a tentativa antijurídica de se alterar o §9º ao art. 2º da Lei Complementar nº 202, de 28 de dezembro de 2004. Em que se intentava ignorar por completo os conceitos já definidos e previstos no artigo 30 e 40, ambos da LC n.º 04/90. Aliás derrota essa que ainda antidemocraticamente não se materializou no respectivo Projeto de Lei de iniciativa do Governador.

 

Na data de ontem (02.07.2021), o Governador Mauro Mendes apresentou a seguinte proposta ao Conselho de Previdência do MT Prev relativa ao desconto da previdência nas aposentadorias:

 

Art. 1º Ficam acrescidos os §§ 10 e 11 ao art. 2º da Lei Complementar nº 202, de 28 de dezembro de 2004, com a seguinte redação: “Art. 2º (...) (...)

§ 10 Para fins do disposto no §5º deste artigo, a contribuição previdenciária dos aposentados e pensionistas incidirá sobre a parcela que supere R$ 3.300,00 (três mil e trezentos reais), quando o valor bruto dos proventos for inferior a R$ 9.000,00 (nove mil reais).

§ 11 Os valores estabelecidos no parágrafo anterior, serão atualizados anualmente, com base no índice de revisão geral anual concedido aos servidores do Poder Executivo.

 

A proposta acrescenta o § 10 e § 11 ao artigo 2º da Lei Complementar n.º 202/04, em que pese não haver o parágrafo 9º no dispositivo legal.

 

A intenção é estabelecer que a contribuição previdenciária de 14% (inciso II do artigo 2º da LC 202/04) dos aposentados e pensionistas incidirá sobre a parcela que supere R$ 3.300,00 (três mil e trezentos reais), quando o valor bruto dos proventos for inferior a R$ 9.000,00 (nove mil reais).

 

Temos o exemplo representativa de que uma professora que hoje recebe uma aposentadoria no valor de R$ 4.000,00. Estaria atualmente com uma tributação incidente em R$ 2.900,00 que passaria a ser de R$ 700,00, ou seja, o valor da contribuição previdenciária deixaria de ser de R$ 406,00 para R$ 98,00.

 

Acontece de que hoje, a tal incidência de 14% é sobre os valores que excedem o valor de R$ 1.100,00 (1 salário mínimo), até que persista o déficit atuarial do Regime Próprio de Previdência Social do Estado de Mato Grosso, conforme o § 5º do inciso II do artigo 2º da LC 654/2020:

 

 § 5º Em razão do déficit atuarial do Regime Próprio de Previdência Social do Estado de Mato Grosso e enquanto esse persistir, a base de cálculo da contribuição prevista no inciso II do caput deste artigo será a parcela dos proventos de aposentadoria, reserva remunerada ou reforma e pensão que supere 1 (um) salário mínimo.” (Grifos nossos).

 

Somente em caso de superação do déficit atuarial do Regime Próprio de Previdência Social do Estado de Mato Grosso, a incidência de 14% seria sobre os valores que excediam o valor do teto do valor pago de aposentadoria do Regime Geral (INSS), que atualmente é de R$ 6.101,60, conforme o inciso II do artigo 2º da LC 654/2020, o vejamos:

 

“ II - 14% (quatorze por cento) da parcela dos proventos de aposentadoria e pensão que supere o limite máximo estabelecido para os benefícios previdenciários do regime geral de previdência social de que trata o art. 201 da Constituição Federal.”

 

A nova proposta do Governador Mauro Mendes junto Conselho de Previdência do MT Prev não revoga os § 5º e § 6º do artigo 2º da LC 654/2020.

 

Porém, deveria ter sido previsto a revogação dos § 5º e § 6º do artigo 2º da LC 654/2020, por haver o requisito de um mínimo de tecnicidade de clareza e coerência em qualquer Projeto de Lei, conforme inciso I do §2º do artigo 9 da Lei Complementar n.º 06/90.

 

Pois, caso haja a coexistência dos § 5º e § 6º e do § 10 e do § 11, todos do artigo 2º da LC 654/2020, ter-se-á duas antinomias jurídicas.

 

A primeira antinomia jurídica é de que a isenção parcial da contribuição previdenciária do novo § 10 do artigo 2º da LC 654/2020 poderá ser interpretado em contradição ao que estabelece o final do § 5º (pensão que supere 1 (um) salário mínimo).

 

Ainda a nova proposta do Governador Mauro Mendes junto Conselho de Previdência do MT Prev entra em conflito com a redação atual do § 6º do artigo 2º da LC 654/2020, pois esse determina que superado o déficit atuarial, estará isento de incidência a título de contribuição previdenciária a aposentadoria menor do que o valor de R$ 3.000,00, conforme o § 6º do inciso II do artigo 2º da LC 654/2020, vejamos:

 

 

“§ 6º Ficam isentos da contribuição estabelecida pelo § 5º os segurados do Regime Próprio de Previdência Social do Estado de Mato Grosso cujos proventos, em sua totalidade, sejam inferiores a R$ 3.000,00 (três mil reais), reajustados anualmente de acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – IPCA.”

 

O conflito é em razão de que: A) o valor nominal da isenção parcial em que se terá no § 10 é de  R$ 3.300,0 com correção pelo índice da RGA (o qual pela política governamental de austeridade fiscal não se pode ter qualquer segurança jurídica a respeito); B) o valor nominal da isenção parcial em que se terá no § 6º é de  R$ 3.000,0 com correção pelo IPCA (índice federal regularmente medido e divulgado pelo IBGE).

 

As duas antinomias jurídicas devem-se ao fato da nova proposta do Governador Mauro Mendes ignorar o conceito de déficit atuarial e a respectiva superação do mesmo definem quando a alíquota de 14% será incidente: 1º) sobre a parcela dos proventos de aposentadoria, reserva remunerada ou reforma e pensão que supere 1 (um) salário mínimo; ou 2º) da parcela dos proventos de aposentadoria e pensão que supere o limite máximo estabelecido para os benefícios previdenciários do regime geral de previdência social.

 

Tem-se assim que o déficit atuarial e a respectiva superação do mesmo é o fundamento que diretamente definem o tempo em que se vigorará o aumento da base de cálculo de incidência da contribuição previdenciária. Sendo assim, não poderia ter sido ignorado pela nova proposta do Governador Mauro Mendes junto Conselho de Previdência do MT Prev por haver um mínimo de tecnicidade de clareza e coerência em qualquer Projeto de Lei, conforme inciso I do §2º do artigo 9 da Lei Complementar n.º 06/90.

 

O que a proposta deveria conter é a revogação do § 5º do artigo 2º  da LC 654/2020.

 

Por essa necessidade foi muito oportuno o pedido de vista dos representantes dos segurados, conselheiros Lázaro Amorim e Umbelino Neves.

 

Os representantes dos Segurados foram novamente estratégicos, hábeis e ponderados em solicitar vista a proposta. Já que devem analisar a questão com todo o cuidado. Sobretudo, devem exigir o atendimento profícuo, transparente e eficiente pelo Presidente do MT Prev, o também servidor Eliton, para que seja viabilizado os dados e o consequente estudo atuarial da proposta a ser apresentada em nome dos Segurados.

 

Tem-se que enaltecer que essa participação dos servidores no Conselho de Previdência do MT Prev não é favor do governante do momento, decorre diretamente do texto constitucional em que se tem expressamente descrito o direito de participação de trabalhadores e empregados na gestão colegiada deste Órgão, conforme previsto no art. 10 da Constituição da República:

 

“Art. 10. É assegurada a participação dos trabalhadores e empregadores nos colegiados dos órgãos públicos em que seus interesses profissionais ou previdenciários sejam objeto de discussão e deliberação.” (Grifo nosso).

 

Assim por simetria também o é com a Constituição do Estado de Mato Grosso em que se tem por nítida a garantia da presença desta e de todos os outros Conselheiros que aqui estão representando o segmento dos Segurados, vejamos o artigo 15:

 

“Art. 15 O Estado garante a participação dos servidores públicos estaduais e municipais nos organismos públicos em que seus interesses profissionais ou previdenciários sejam objeto de discussão e deliberação, na forma da lei.” (Grifo nosso).

 

 

A participação em colegiado previdenciário que seja objeto de discussão e deliberação significa que aos próprios Servidores Estaduais cabem a defesa de seus interesses previdenciários. Não há o que se divergir da literalidade dos artigos 10º da Constituição Federal e o 15º da Constituição Estadual: são os servidores estaduais que fazem diretamente a defesa dos interesses dos servidores estaduais, no modo, tempo e forma que lhes cabe autonomamente definir.

 

Esses interesses estão sendo bem defendidos e discutidos, como por exemplo quando se teve uma decisão em que o voto juridicamente técnico dos Segurados restou aprovada por maioria dos membros do Conselho de Previdência ou quando se tem feito o pedido de vista, tal como estabelece os termos da Lei Complementar n.º 560/14 e o Regimento Interno do Conselho de Previdência.

 

Apesar de todas as críticas possíveis e imagináveis que os representantes das Instituições Seguradoras expuseram na imprensa, de forma a desrespeitar o princípio da colegialidade. A decisão da maioria do Conselho da Previdência foi, é e sempre será a decisão não de um membro, de um segmento, mas sim do Conselho como um todo.

 

Esse é o princípio basilar da Democracia. Da Grécia antiga a votação em qualquer Condomínio: não há democracia sem respeito a autoridade da decisão da maioria.

 

A exposição que foi submetido o Conselho da Previdência junto a sociedade pelos representantes das Instituições Seguradoras foi ilegítimo, irracional e ainda imoral. Ilegítimo, pois o Fórum adequado para tanto era a reunião do próprio Conselho de Previdência. Irracional, pois não há qualquer lógica de respeito ao colegiado, quando se ataca um posicionamento que lhe é contrário sem a oportunidade do se chama de dialética. Imoral, pois essa possibilidade do uso e abuso da imprensa para promover vilaniedade com o nome e a opinião do outro se dá em razão do dinheiro público despejado em sites dependentes do Governo.

 

Tenho mais do que a convicção, a certeza de que todos que aqui votaram em prol da Proposta dos Segurados e solicitaram o pedido de vista o fizeram com a tranquilidade daquele que bem soube qual era a voz que se clamava nas tantas carreatas dos servidores aposentados: a que luta por Justiça, Dignidade e Respeito.