sábado, 17 de março de 2012

A epopéia do sonho da democracia e ética na OAB/MT.

Ulisses, nosso personagem, havia conquistado o direito de ser advogado. Não foi um único dia o sonho esquecido, na cátedra havia sido dedicado, e foi aprovado no Exame da Ordem. Chegara o momento, pensava com exatidão de detalhes o passar à suas mãos a Carteira Vermelha, o olhar para frente e o dizer à sociedade que estava a postos para ser um operário da Justiça.
A convocação tão almejada apareceu, de forma estranha, disseram ao telefone que teria que conservar com a OAB. As portas do azul celeste, lá estava Ulisses, após subir as escadarias da Ordem. Percebeu que no Centro Político Administrativo de Mato Grosso, se fazia presente ao lado dos Poderes Constituídos, a sociedade representada pela classe dos advogados.
Antes de terminar de empurrar a grandiosa porta, olhou ao lado e viu o emblema da Ordem esculpido na parede, e soube naquele momento que ele próprio seria a força da representativa da OAB. Agora, um impressionante salão havia lhe tomada a visão, não conhecera ainda tal superestrutura, o aspecto da subida do olhar ao teto deu-lhe a exata noção do alcance da missão da advocacia.
Não havia ninguém na mesa da recepção, os folhetos todos jogados ao chão, as samambaias na parede estavam secas, e sem perceber mais nada, a luz simplesmente apagou. Ulisses assustado, ouviu uma voz lhe dizendo que não precisava ter medo, bastava-lhe a confiança.
A luz então se fez novamente, na rampa que liga o átrio ao plenário, em frente a ata da fundação da OAB/MT estava um Senhor que assim lhe dirigiu a palavra que ressoou no mesmo tom do vento que avisa a chuva cuiabana:
- Prazer, Ulisses, deixe me apresentar, meu nome é Silva Freire, eu sou a OAB/MT. Antes de receber a honrosa incumbência da advocacia, terás que comigo conversar. À ti confiarei o futuro da Ordem, duvidareis de mim e a oportunidade de advogar lhe escapará pelas palavras.
Então, atônito, Ulisses viu os panfletos arrumando-se na mesa a frente, e as samambaias na parede recuperando o verde. Apressadamente se pôs a confiar no outro, mas a duvidar da sua própria capacidade para tal responsabilidade, respondeu:
- Não percebeu, sou jovem e nada sei sobre o que se passa aqui.
- Exatamente em razão disso, Ulisses. Os retratos dos ex-presidentes, que sustentam as paredes da OAB/MT, não nos permitem vagar mundo afora. Estamos todos presos ao que somente acontece aqui dentro. Olhará em meus olhos e comigo terás a primeira e mais sinceras das tuas audiências.
Indo ao acesso a rampa, reparou que na mesa da secretária havia a carteira, o documento de retirada, e a caneta para assinatura, pensou que não era então só estudar, passar no exame, mas teria que saber o que é ser um advogado.
Em cima de Ulisses, a porta ao final da rampa que liga o átrio a sala de reuniões se fechava. Por ali, havia passado Silva Freire. A pressa de entrar sem deixar a porta fechar, sem ter que fazer o esforço de abri-la novamente, impossibilitou Ulisses de ler a ata de fundação da OAB/MT postada na parede da curva da rampa.
Silva Freire, já havia entrado na sala de reuniões, novamente outra porta havia indicado à Ulisses o caminho a seguir. A pressa de se fazer respeitar por bem seguir os passos, lhe impediu de encarar a galeria dos retratos dos ex-presidentes. Ao entrar, na sala, percebeu que a bancada daquela audiência era diferente de todas as outras, era uniforme, ali não havia hierarquia entre advogados. Então lhe foi dito:
- Senta-se, e lembre que na tua casa, serás sempre convidado a ombrear em nossas lutas e anfitrião a bem receber os cidadãos. Olhai o meu rosto, e descreva-me com toda a crítica que move a mudança.
- Vejo um velho, desacreditado, que perdeu a esperança no olhar, carcomido pela mesmice do que acontece aqui dentro.
Inesperadamente, um grito lhe toma os ouvidos:
- Calúnia! Cala-te. Você não é digno de tais palavras, eu sou a OAB/MT, tenho história. Eu fiz a democracia ressurgir neste País. Eu fundei a República Federativa do Brasil. Estava certo, a sua juventude não lhe permite avaliar nada, você não conhece nada.
O peso da autoridade pesou na razão de Ulisses, assustado não sabia o que fazer. Sabia que havia sido muito ousado, mas que já assumira a responsabilidade com a verdade, tentaria novamente explicar-se.
- Presidente, quero lhe dizer que minha geração não conhece a OAB que tanta se fala. Não estava lá, não vi acontecer, faz muito tempo. Havia me dito que não sabia o que acontece lá fora, pois bem, eu lhe digo a OAB em nosso Estado não tem esta mesma postura que te orgulha.
- Difamação! Somos todos filhos da respeitabilidade desta instituição. Nenhum de nos pode dizer nada que possa desacredita - lá. Já que acusa, terá que provar. Não queres ser advogado, sustentará a sua infâmia à todos os ex-presidentes da Casa de Montezuma. Ao plenário!
Ulisses sai da sala de reuniões anestesiado pelo grito, mas percebera então o desafio que a vida lhe havia colocado: a advocacia não sabia mais o que era advocacia, e era chegada a hora do resgatar da própria definição. Passo a passo até o púlpito do plenário, o jovem estudante amadurava, não pensava em artigos, incisos, alíneas, sabia que a defesa teria que ser em princípios.
- Vamos, meu rapaz! Está aberta a Sessão Magna de Julgamento do que é advocacia em Mato Grosso. Eu, Benedito Sant’Ana da Silva Freire, na qualidade de presidente desta, designo para o debate, três advogados dos quadros de nossa história: João Villasbôas, Luís Carlos Ribeiro, e Ussiel Tavares. Convoco ao púlpito da história, para responder os questionamentos, o ainda bacharel de direito, Ulisses. Comecem o debate!
- À mim, João Escolástico Villasboas, foi confiada a honrosa carteira de número 1 da OAB/MT. Nas lutas que travei na advocacia e na política, sempre carreguei a vaidade de dizer que respeito é sinônimo de trabalho árduo. As margens do rio Paraguai, conheci a lição da vida que para seguir a correnteza é preciso astúcia para não afundar, e para subir o rio é preciso força para não desistir. Pergunto então, o que é advocacia, Ulisses ?
- É o barco, a que o advogado segue remando. Nossa correnteza é a burocracia que nos empurra sempre a fazermos que já se faz, nosso cuidado é para não afundarmos na formalidade e esquecermos do conteúdo. A força que precisamos não é para mudar o curso do rio, mas sim para subirmos até a nascente, limpando daquilo que o polui.
- Luís Carlos Ribeiro, advogado, preso político da ditadura militar de 64. Carrego comigo as marcas da ofensa à prerrogativa da nossa profissão. Conheço a vitória da democracia, porque sei o sabor dos amargores do autoritarismo. A prisão me ensinou isto: a vida do homem é feita da compreensão da liberdade. Olhar o céu pode ser simples, mas quando preso passei à lhe dar a devida importância. Ulisses, quero saber o que é democracia ?
- É a luz do Sol. É o princípio da advocacia. A onipresença em tudo o que um advogado faz pode causar a sensação de insignificância. A liberdade de compreendermos o direito, a liberdade de pedirmos por justiça é o céu que sem a democracia se torna a sombra sem fim.
Interrompendo o debate, o presidente da sessão, começara a fazer uma fala de justificativa:
- Nesta sessão, em razão do que se tem ultimamente falado nos corredores da Casa de Raymundo Faoro de que supostamente uma concorrência para contratação de escritório de advogado foi fraudada, abriremos uma exceção. Permitiremos, ao advogado Ussiel Tavares, que faça a última das perguntas.
- Tenho serviço prestado à OAB/MT, construi este prédio, hoje presido o Tribunal de Ética e Disciplina. Aqui defendi investigação de denúncias de compra de sentenças, e até vi Presidente de Tribunal de Justiça lamuriar aos prantos a ética da magistratura. Mas agora, perdeu um pouco o sentido, não sei mais qual é a moral que nos permite ainda continuar a ficar na representatividade da classe depois de 18 anos. Pergunto: o que é ética ?
- Ussiel, não sei o que ética. Não se pode teorizar ética, ou praticamos ou não a temos. Posso dizer que ética é o sentir. Sinto a ética da representatividade da advocacia em nosso emblema. Sinto a ética da importância da advocacia em nossa sede. Sinto a ética histórica na ata de fundação da OAB/MT. Sinto a ética de luta na galeria dos ex-presidentes da OAB/MT. Porém, não sinto a ética no jeitinho da licitação que se frauda a concorrência. O que acredito que a corrupção é a ambição de todos que se tornam incapazes de acreditar na advocacia, e que na democracia a transparência dos processos postos a luz do dia, realmente é a arma contra esses vendilhões.
Ulisses então, pode acordar do sonho, e se tornar um advogado em Mato Grosso.

Bruno Boaventura. Advogado. Membro do Movimento OAB Democrática e Ética.

2 comentários:

Anônimo disse...

Eu até pensei em ler.
Mas com essa fonte usada, desisti.

Anônimo disse...

Por falar em ética e a falta dela, me diga em que pé anda a ação movida por Faiad por danos morais contra essa sapientíssima e ilustrada pessoa! Diga, Ulisses Boaventura????