terça-feira, 22 de abril de 2008

A doença catilinária.

O duelo da política de Roma entre Cícero e Catilina, ou ao menos aquele que ficou na história, é um bom exemplo da luta entre a moralidade e a corrupção. Cícero, orador venerado, teria sido o responsável pela descoberta de uma tramóia de Catilina que pretendia sublevar a ordem em Roma. Catilina poderia ser representado hoje como um politico que sonelentemente confunde o privado com o público e o econômico com o político. Cícero seria como um atento guardião do decoro parlamentar.
Na história romana, Catilina que é expulso pelo Senado, ou seja, é o grande corruptor da política que é colocado para fora do jogo, mas será que hoje permanece assim? Você certamente irá concordar comigo que não, principalmente pelo senso comum disseminado que qualquer pessoa de consciência limpa e o mínimo de decência reluta em entrar para o jogo político pelo medo de que seu relacionamento com os políticos acarretaria em uma contaminação da imoralidade. Mas aqui vai uma grande verdade do senso crítico: o mal que afeta os nossos políticos é o mal que afeta toda a nossa sociedade. Devemos parar de pensar os políticos corruptos como doentes a serem curados por algum médico plantonista, mas sim como uma doença que já nos contamina. Com o raciocínio de que os políticos são a doença e nãos os doentes, construímos a reflexão de que a sociedade é como um organismo que precisa se curar para não perecer por inteiro, e não que os políticos isoladamente considerados não conseguirão contaminar a maioria da sociedade. Catilina conseguiu contaminar um exercito de gente perdida e desesperançosa, dizem que estes não tinham o poder de infringir as Leis, mas sim de aboli-las.
Mas a história conta que foi Cícero que se sagrou vitorioso nesta batalha da guerra humana da probidade, em razão de sua perspicácia ética de um cônsul que não esquecia nunca de sua pátria, e que ou vivia com seus cidadãos ou morreria por eles.
A grande lição que ficou é que foi escrita uma história em que a moralidade pode ter tido um exemplo prático. As histórias de hoje nos atentam mais em acreditarmos pelo menos na política, em finais imorais. Os escândalos sexuais, financeiros e sobretudo de imoralidades enchem o gosto tosco daquele que se deliciam-se com a promiscuidade de nossos políticos. Devemos ter a real preocupação de que a cada história descrita de batalha vencida contra a corrupção nos é dada uma outra chance de refletirmos, pois em cada uma dessas histórias um grupo de conspiradores cai juntamente com o seu Catilina, mas o que nos resta é uma pergunta sem resposta: até quando você, Cícero, deixará os Catilinas abusarem de nossa paciência ?Bruno J.R. Boaventura

terça-feira, 15 de abril de 2008

Leis: consolidar é preciso.

A consolidação é definida como a técnica legislativa que implica o exame, triagem, seleção e posterior reunião das leis em coletâneas, facilitando assim a consulta ao seu texto por parte dos que devam conhecê-las. É, sobretudo, um trabalho de tornar claro aquilo que se apresenta de forma multiplamente confusa.
Consolidar é oferecer unicidade material ao ordenamento, ou seja, caracterizar as questões materiais de forma única e coerente no ordenamento. Na elaboração do projeto de consolidação é necessária a sistematização das leis pela confrontação das normas, seja vertical ou horizontal, com a aplicação dos critérios solucionadores das antinomias aparentes nas seguintes ações: de fusão de disposições repetitivas ou de valor normativo idêntico, na supressão de dispositivos revogados por leis posteriores e/ou especiais, na a supressão de dispositivos declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Tribunal de Justiça, na indicação de dispositivos não recepcionados pela Constituição Federal ou Constituição Estadual.
A consolidação faz com que a linguagem das Leis seja mais compreensível, revelando com mais facilidade a realidade normativa, trazendo a tona àquilo que o Poder Legislativo produziu, tornando-o mais efetivo. Ao legislador cabe a consciência que sua responsabilidade enquanto membro do poder é primar pela qualidade e clareza de seu trabalho legislativo, invés de se demonstrar apático à necessidade de sistematização através da consolidação, como ainda crêem alguns.
Um maior conhecimento das Leis, e conseqüentemente dos direitos, é maior a probabilidade de reconhecimento do problema social como um problema jurídico, facilitando assim a justa reivindicação, principalmente aos cidadãos de menores recursos.
Ao clarificar a sua produção o Poder Legislativo valoriza a sua atuação no pacto governamental, harmonizando a relação entre os demais poderes, sobretudo com o mastodonte do Executivo. Define de maneira mais evidente qual a valoração do fato está em vigência, abrindo com mais vigor o número de pessoas que possam contrapô-la. Desfaz assim um pouco o mito da linguagem legal como inacessível às pessoas comuns, esvaziando os tantos Hermes, Moises-Aarão, Maomé-Abdula que ainda tenham exclusivamente para si a tarefa transformadora da hermenêutica normativa como propulsora da evolução do sistema jurídico como concretização do elemento democrático da cidadania.
A crise da legalidade, que por alguns é a motivação para a tese constitucionalista do controle de conformidade constitucional dos atos jurídicos, pode e deve ser superada através de instrumentos, como a consolidação, que garantam que a lei seja efetivamente um produto claro de uma ação humana acessível e assim democrática que visa melhores condições de vida ao povo.

Bruno J.R. Boaventura – Advogado militante em direito público e colaborador das seguintes revistas: Interesse Público (Editora Fórum), de Direito Tributário e Finanças Públicas (Editora RT), do Administrador Público (Editora Governet), e Direito e Democracia (Editora Ulbra).

quarta-feira, 2 de abril de 2008

A consciência da existência.

Os homens se dividem naqueles que acreditam em uma força superior comandando a natureza das coisas, e naqueles que possuem a consciência da existência humana. Estes últimos visualizam a existência como o pequeno lapso temporal de suas vidas, possuem o discernimento que suas existências se fazem no passado, no presente e no futuro. O ser não é somente ser, é uma conjugação do foi, do é e do que será. A consciência da existência é saber que a vida de cada um dos homens, e isto vale para si próprio, é como uma fagulha em um Sol de humanidade. Mas que cada faísca desta fagulha tem um brilho que lhe é único.
Ao plantarmos uma árvore temos a certeza de como será o formato de seu tronco, em razão das características próprias da espécie, mas não sabemos como será a sua disposição ao longo do tempo de seu crescimento, e muito menos das folhas e frutos. O que temos a certeza absoluta que ai estará sendo gerado uma vida. Não é a forma do tronco ou da árvore como um todo que caracteriza a vida, mas sim o processo biológico próprio daquela árvore de nascer, desenvolver e morrer gerando frutos ao longo de um determinado tempo e espaço. O que caracteriza a vida do humano não é a própria disposição em ser fisicamente como todos os outros humanos, mas sim ter a consciência que o seu processo biológico de nascer, desenvolver e morrer gerando pensamentos e ações ao longo de um determinado tempo e espaço lhe é próprio. Ser o que eu sou é ter a consciência que sou único entre todos o que existiram, existem e existirão.
Realmente existir conscientemente é saber que a cada momento você deixa de existir, que somos uma ínfima parte representativa da humanidade, mas que vale a pena se esforçar ao máximo para aproveitar as experiências que a sua existência fornecerá à você, pois serão únicas, a medida que cada um de nós vive um conjunto próprio de experiências, e são estas que nos moldam como seres únicos. É deste conjunto próprio que surge a nossa individualidade, pois é a partir dele que desenvolvemos nossos pensamentos.
O que me preocupa é a respeitabilidade da individualidade, pois esta é a todo o momento sugerida e não propriamente desenvolvida. A individualidade da consciência, o pensar diante de uma dada questão pela auto referência ao conjunto de experiências próprio à cada um, é a reafirmação de nossa existência.
O que nos faz seres diferenciados dos restantes é a nossa consciência, o que nos reafirma como existentes é a maneira diferenciada que pensamos. Pensar logo existir não é o aforismo ideal, e sim, existir conscientemente é a co-existência diferenciada em uma comunidade.
As escolhas são colocadas como um rol de possibilidades já exaustivamente delineadas. Os estereótipos são moldados pela massificação das idéias diante da generalização das experiências. O respeito da individualidade não é respeitar as escolhas, mas sim respeitar a capacidade de cada um de gerar escolhas que sejam próprias.
Não reafirmamos a nossa individualidade ao sujeitarmos a coletividade, mas sim quando fazemos a comunidade respeitar a nossa individualidade. É o conjunto de experiências que molda a consciência, e é a consciência que determina a existência.
No fundo todos os pecados representam uma só noção: o desperdiço de tempo e pensamento em ações dadas como não aprovadas.
Existencialmente somos um animal como tantos, temos que ver para crer, ouvir para saber, saborear para provar, respirar para viver,e locomover para sobreviver. Mas diferentemente o homem tem a reunião de seus sentidos em um sexto modo de percepção: a consciência. Esta é capaz de reunir os outros modos de percepção e projetar com base no conjunto de experiências que vivemos e/ou apreendemos um sentido próprio para o dado que nos é colocado a perceber, e o que nos diferenciada ainda mais é que somos os únicos que podemos projetar com base em único dado não só diferentes concepções desta realidade, mas sobretudo diferentes concepções fantasiosas.
O modo diferenciado que avaliamos nosso medo é um bom exemplo. O medo é o alerta da sobrevivência, somos capazes de conscientemente avaliarmos o nosso medo, para sabermos se realmente a ação que transcorre coloca em risco a nossa existência, mas e quando não se tem esta consciência da existência ? Temos medo sem risco, ou não sabemos discernir do fantasioso do real.
A vida é uma busca incessante de significado para a própria vida, mas com tantas múltiplas possibilidades de significância, existira então um só significado possível ? Somente o de que a vida humana é puramente uma interpretação incessante da própria vida.

Bruno J.R. Boaventura – Advogado militante em direito público e colaborador das seguintes revistas: Interesse Público (Editora Fórum), de Direito Tributário e Finanças Públicas (Editora RT), do Administrador Público (Editora Governet), e Direito e Democracia (Editora Ulbra).