sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

A ideologia do lucro – Parte II.

O Estado se transmudou para uma simples estrutura monolítica da indiferença, na qual encarna as forças impessoais do mercado que pretendem submeter às políticas públicas sociais. O risco é que a referência exclusivamente econômica traz em si todos os germes da concepção totalitária que reduz o Estado a um mero instrumento de execução de leis sobre-humanas que se supõem impor-se a todos. Este risco não é trazido pela utilidade em ser eficiente, ou seja, produzir o máximo no sentido do máximo saldo líquido de satisfação, mas sim pela não distribuição igualitariamente do que foi produzido. O problema está em utilizar a idéia do cálculo para ser eficiência quanto ao resultado, mas não enquanto a divisão do resultado. Afinal, ser eficiente para que? Para dividimos os resultados, ou para que cada um possa ser eficientemente explorado? A ideologia do lucro formada a partir da matriz de que a economia é o método de análise natural de todos os aspectos da vida humana, reduz o pensamento ao cálculo, é a economização e a mercantilização total das atividades humanas, sua aspiração e tendência. Conceitos incompatíveis com a própria natureza humana: é acreditar na transformação do homem em robô. É o contra-senso de querer desumanizar uma ciência humana, ignorando as relações sociais inerentes existentes entre os homens em qualquer relação de trabalho. Esta visão do mundo está em seu momento limite, não há mais com esta falaciosa tese do desenvolvimento econômico acima de tudo continuar prosperando, a natureza não tem mais suportar esta modalidade de relação, a crise econômica mundial do capital financeiro improdutivo que retorna a política pública do big to fail, e principalmente, socialmente já nos encontramos na barbárie da desigualdade social, sobretudo no Brasil.
Bruno J.R. Boaventura

Obama: a era da responsabilidade

O fato de um homem negro assumir a presidência do império americano é digno de constar na história, e por isso digno de ser referenciado em todos os campos das ciências humanas, inclusive no direito. A referência feita nesta introdução é que no discurso de posse de Barack Obama temos uma nítida compreensão da retórica da mudança representada como porta de entrada de uma nova era, a da responsabilidade. Primeiramente, o discurso apresenta a figuração anti-heroíca da era atual que vem sendo marcada pela ganância desenfreada que acarreta a crise econômica e pela incapacidade de mobilização social, falsas promessas, dogmas desgastados, e disputas vazias como causas da crise política. O idealismo é o da liberdade com a igualdade não falando em solidariedade, tendo como crença o velho conceito protestante da mobilidade social pelo mérito do individuo. Não é novo, mudam-se as palavras ainda permanecem os conceitos, é uma tentativa de um novo passo com velhos sapatos. Não reforça o coletivismo, mas expressamente repulsa a elite parasitária que vive dos prazeres da fortuna e da fama. Este velho idealismo renovado gera na atualidade a necessidade ambiental da reversão da dependência humana para com os combustíveis fósseis, utilizando para tanto o sol, os ventos, e numa forte alusão aos bio-combustíveis também o solo. No modelo governamental da nova era da responsabilidade de Obama o neo-liberalismo já não é mais unânime. No discurso isto é entendido pela menção da redução da importância da discussão do tamanho do Estado. E tal evidência é reforçada quando Obama atrela a funcionalidade estatal com ajuda as famílias, salários decentes, assistência social, e aposentadorias dignas, receitas sociais estas evidentemente não dispostas no cardápio privatizante do neo-liberalismo. Na esfera econômica a palavra de ordem é a regulamentação, ou seja, a estipulação das responsabilidades dos capitalistas financeiros e da obrigatoriedade de transparência nas operações por eles efetuadas. Obama atenua o mercado como ente metafísico dominante, mas também não o excomunga e assume a retórica do longo prazo no controle do equilíbrio da distribuição da riqueza produzida. Na questão internacional, se resume a dizer que a abundância dos países desenvolvidos é gerada pela exploração dos recursos dos outros países. A compensação desta exploração deve ser então feita aos países fronteiriços, numa assunção do reforço dos blocos econômicos regionais. Todos estes fatores do discurso de Obama nos permitem afirmar que através da consciência da dupla face da histórica realidade atual, crise e mudança, o que existe é a retórica da necessidade da continuação da sobrevivência do próprio capitalismo que permite e alimenta o modo de vida americano. A mudança é representada por palavras de consenso e não muito ousadas para a famélica necessidade de quebra de paradigma na concepção ambiental, política, e econômica. Enfim o que não se fala é que a crise na verdade é de identidade do homem para com um modo devastador de produção que corrompe à todos e a tudo.

Bruno J.R. Boaventura