A modernidade
sendo analisada pela questão social como um projeto civilizatório que englobou
a humanidade como um todo se caracteriza por ter sido fundamentada no negro
enquanto raça que foi e ainda é escravizada, traficada, superexplorada e
assassinada.
O racismo, a
desigualdade fundamentada na suposta cientificidade da existência de raças, foi
a realidade do projeto da modernidade no Brasil e em Mato Grosso.
Façamos uma
analise econômica, façamos uma analise histórica, façamos uma analise
sociológica, façamos qualquer analise, a única que demonstrará o contrário do
que estou afirmando será uma analise teórica fundamentada no preconceito de que
devemos nossa história é exclusivamente a história da realidade do chamado
homem branco.
O branco pobre
tanto europeu, como brasileiro ou mato-grossense foi submetido a exploração dos
centros urbanos na implantação da urbanização moderna, mas nada, nada se compara
a mais horrenda e miserável condição de vida que o ser humano já viveu em toda
a história quando a civilização
ocidental foi baseada na superexploração pela escravidão do homem negro.
O Brasil foi
um dos territórios que este projeto econômico da modernidade se serviu como
fonte da acumulação primitiva. Porém diferentemente dos demais, para cá vieram
mais negros do que nenhum outro lugar do mundo. Aqui se perpetuou o mais longo
regime escravocrata do mundo. Em Mato Grosso, a particularidade racial foi
ainda mais expressa já que o processo de imigração da mão-de-obra europeia não
foi implementado. A base do conservadorismo mato-grossense enquanto sertão,
enquanto periferia da periferia, foi que a não imigração permitiu que a relação
dialética senhor/escravo permanece ainda mais enraizada enquanto dilema de
nossa anti-modernidade.
O que pode ser
repetitivo para alguns, é por mim considerado como ênfase de que não há como
desconsiderar para efeito do entendimento do que é o Estado, a Sociedade e o
Mercado no Brasil e em Mato Grosso a realidade da população negra.
Atualmente, a
particularidade racial da questão social evidentemente permanece, mesmo após
125 anos da abolição da escravidão.
A incompletude
da modernidade brasileira será resolvida quando a herança maldita do racismo
não mais perdurar como particularidade da questão social. Manteremos a
mentalidade colonial de centro/periferia enquanto mantivermos tal binômio da
divisão internacional do trabalho expresso no nosso binômio da divisão interna
do trabalho.
A prova atual da
existência da particularidade racial da questão social é que desigualdade
social ainda se confunde com desigualdade racial. Conforme um informe da ONG Articulação
de Organizações das Mulheres Negras, um levantamento feito pelo governo
federal, com base em dados preliminares do Censo Demográfico de 2010, do IBGE
(Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), e estudos do Ipea (Instituto
de Pesquisa Econômica Aplicada), revelam que 16,2 milhões brasileiros, o
equivalente a 8,5 % da população do país vivem em situação de extrema pobreza,
com uma renda per capita de até R$ 70,00 por mês, ou pouco mais de R$ 2,00 por
dia. Desse total, 70,8% são afrodescendentes e 50,9% têm, no máximo, 19 anos de
idade.
Os dados
do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada explicitam que, no contexto da
informalidade 21,4% das mulheres negras estão no trabalho doméstico e nas
menores proporções de trabalho com carteira assinada (23,3%) ocupando, assim,
como confirmam os dados de renda, a pior posição na escala social.
Conforme o
relatório do Centro Brasileiro de Estudos Latino Americanos, entre 2002 e 2010,
segundo os registros do Sistema de Informações de Mortalidade, morreram
assassinados no país 272.422 cidadãos negros, com uma média de 30.269
assassinatos ao ano. Só em 2010 foram 34.983. Esses números já deveriam ser
altamente preocupantes para um país que aparenta não ter enfrentamentos étnicos,
religiosos, de fronteiras, raciais ou políticos: representa um volume de mortes
violentas bem superior à de muitas regiões do mundo que atravessaram conflitos
armados internos ou externos. Considerando o conjunto da população, entre 2002
e 2010 as taxas de homicídios brancos caíram de 20,6 para 15,5 homicídios –
queda de 24,8% – enquanto a de negros cresceu de 34,1 para 36,0 – aumento de
5,6%. Com isso a vitimização negra na
população total, que em 2002 era 65,4 – morriam assassinados,
proporcionalmente, 65,4% mais negros que brancos, no ano de 2010 pulou para
132,3% – proporcionalmente, morrem vítimas de homicídio 132,3% mais negros que
brancos. As taxas juvenis duplicam, ou mais, às da população total. Assim, em
2010, se a taxas de homicídio da população negra total foi de 36,0 a dos jovens
negros foi de 72,0. Entre os jovens a brecha foi mais drástica ainda: as taxas
de homicídio de jovens brancos passaram, nesse período, de 40,6 para 28,3 –
queda de 30,3% – enquanto a dos jovens negros cresceu de 69,6 para 72,0 –
crescimento de 3,5%. Em Mato Grosso tal índice é de 74,2%.
A
parceria da Faculdade Zumbi dos Palmares, com a Secretaria de Políticas de
Promoção da Igualdade Racional da Presidência da República e a Fundação Getúlio
Vargas está produzindo o primeiro banco de dados nacional sobre a população
negra no Brasil. Já se pode saber que no Brasil, 51% da população são formados
por negros, porém representam apenas 20% dos brasileiros que ganham mais de dez
salários mínimos. A população negra também representa apenas 20% dos
brasileiros que chegam a fazer pós-graduação no país.[1]
Acredito então
que a historicização da particularidade racial da questão social no Brasil e em
Mato Grosso demonstra a importância da existência de cotas para desfazimento da
herança maldita do racismo moderno considerando a evidente desigualdade
histórica de condição de vida que foi submetido o negro a partir da
colonização.
Bruno Boaventura.
Mestre em política social pela UFMT.
[1] Disponível em: Fonte: http://www.sae.gov.br/site/?p=11130#ixzz2ensjbnit Acessado em: 13 de maio de 2013.
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