Este texto visa esclarecer sobre a
legalidade/inconstitucionalidade da cobrança estabelecida pela
alínea B do inciso III do artigo § 1º do Decreto n.º 691/2016[1].
Temos que ainda, preliminarmente,
asseverar de que os incisos II e V do artigo 66 da Constituição do Estado de
Mato Grosso[2].
Formalmente, temos assim de que o
Decreto n.º 691/16 deveria descrever o procedimento para fiel execução de uma
lei ou dispor exclusivamente sobre a organização e funcionamento da
Administração, e ainda, na forma anterior que estabelece a Lei.
A
Lei em questão seria a Lei Complementar n.º 172/04 que reestrutura o Fundo de Desenvolvimento do
Sistema de Pessoal – FUNDESP e estabelece no artigo 3º quais seriam as receitas deste fundo público[3].
Baseando-se
nos textos literais das normas, temos as seguintes premissas para efeito de
proceder com o presente texto: 1ª) não há na LEI que reestrutura o Fundo de Desenvolvimento do
Sistema de Pessoal – FUNDESP a previsão de que
haveria receita proveniente de porcentagem incidente sobre os valores
consignados em folha de pagamento a favor de entidade sindical; 2ª) o
fundo sendo público descarta a possibilidade de conceituação do valor cobrado
como tarifa, já que não é adimplemento feito em benefício de particular; 3ª)
será considerando o valor tributado proveniente de uma possível taxa, já que
também não pode ser definido como imposto.
Inicialmente,
se esclarece de que a consignação em folha de pagamento em favor de qualquer
entidade sindical foi estabelecida pelo § 1°
do artigo 65 da Lei
Complementar n.º 04/90[4].
Em virtude da ratificação da Convenção Relativa as relações de trabalho na função pública, 1978, a
de número 151, foi incorporada ao ordenamento jurídico pátrio brasileiro, a
proteção quanto ao ato da Administração Pública em intentar prejudicar a
atividade de organização sindical, sobretudo em ato de ingerência que afete a
sustentabilidade econômica[5].
Não está se afirmar
de que esse 1% comprometeria as finanças do sindicato, mas que a cobrança
existindo poderia ser majorada até que haja repercussão financeira para tanto.
A Constituição
Federal dispõe que no artigo 145 de que as taxas podem ser cobradas quando da
utilização de serviço público, conforme o inciso II[6].
A Constituição do
Estado de Mato Grosso no artigo 150, inciso I, define de que não há
possibilidade de tributo, inclusive taxa, sem que lei anteriormente estabeleça[7].
A Lei descrita é em
sentido literal da palavra, não cabendo, aqui, definir Lei como sendo ato
normativo de efeito abstrato como um Decreto, em razão da própria definição do
princípio da legalidade tributária. Princípio esse que possui exceção de
aplicação em 4 casos determinados constitucional e legalmente: I) art 153 § 1, que faculta ao poder executivo alterar as
alíquotas sobre o II, IE,IPI e o IOF ( denominados tributos regulatórios do
comércio exterior); II) art 177 § 4º, I, b: está indiretamente posto no artigo,
que possibilita ao executivo reduzir ou restabelecer a alíquota da contribuição
de intervenção e domínio econômico ( CIDE ), relativa às atividades de
importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás e seus
derivados e álcool combustível. O ato normativo é o decreto presidencial; III)
art 155, IV, que permite aos estados e ao DF, definir as alíquotas do ICMS
monofásico incidente sobre combustíveis, importante observar que a lei não diz
alterar as alíquotas, mas definir, o que pressupõe maior poder dos
estados e do DF. O ato normativo é o convênio do CONFAZ; IV) Esta exceção está
disposta no art 97 § 2º, do CTN, que diz não constituir majoração de tributo a
atualização do valor monetário da respectiva base de cálculo.
Temos assim, que no caso
em questão não se tratando de hipótese de exceção da aplicação do princípio da
legalidade tributária, é de ser aplicado o que determinam os artigos 5º e 9º do
Código Tributário Nacional[8].
Já o denominado
Código Tributário Estadual instituído pela Lei 2.731/66 define que a
possibilidade de cobrança de taxa de serviços estaduais, conforme os incisos I
e II do artigo 5º[9].
Os artigos 171 e 173
fazem previsão de que os serviços estaduais sujeitos a cobrança de taxa
estariam exaustivamente previstos[10].
No anexo II do CTE
não há também qualquer menção de taxa a ser cobrada por consignação em folha de
pagamento realizada por entidade sindical.
A Lei número 4.587/82
que dispõe sobre o Sistema Tributário Estadual o processo administrativo
tributário e dá outras providências, com o mesmo conteúdo do CTE, também define
que as taxas de serviços estaduais estariam
previstas em rol do regulamento próprio, conforme os artigos 2º e 90[11].
O Decreto 2129/86 que aprova o Regulamento do Sistema Tributário Estadual, instituído pela Lei
nº 4.547, de 27.12.82, define também no artigo 405 por expressa previsão todos
os fatos geradores de pagamento de taxas[12].
Nem destes se pode identificar algo que diga a respeito de consignação em folha
de pagamento em favor de entidade sindical.
Existe a previsão de
que o registro de “de documento e papéis nas
repartições estaduais, a requerimento da parte interessada” seria taxado, e da
probabilidade de que o registro de consignação na folha de pagamento em
benefício de entidade sindical seria definido como tal. Porém não temos de que
tal valor não seria o mesmo estipulado no Decreto 691/16, e principalmente, de
que a pessoa jurídica de direito privado definida como Administradora é à quem
cabe realizar o serviço de processamento da consignação não é a beneficiária do
pagamento da suposta taxa, conforme o artigo 11 do Decreto 691/16[13]. Assim sendo, não há contraprestação útil do Estado para que o mesmo
seja beneficiário de taxa, conforme leitura decisões do Egrégio Tribunal de Justiça de
Mato Grosso, a seguir
tratadas.
Sendo assim, pela
simples leitura dos textos legais existentes se pode chegar à conclusão de que
não há qualquer previsão em LEI quanto ao pagamento de taxa de serviço estadual
por entidade sindical quando o registro em folha de pagamento de consignação em
seu favor pela Administração Pública, mas apenas e tão somente em DECRETO.
O
princípio da reserva legal foi afrontado, sendo assim, é possível a declaração
de ilegalidade e da inconstitucionalidade da alínea B do inciso III do artigo § 1º do Decreto n.º 691/2016.
Em específico, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso
estabelece que mesmo a previsão em LEI de criação de taxa, deve haver o que se
conceituou como “contraprestação útil por parte do Estado”: ReeNec 148830/2015,
DESA. MARIA APARECIDA RIBEIRO, PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO,
Julgado em 02/10/2017, Publicado no DJE 10/10/2017); (ADI 51410/2015, DES.
GUIOMAR TEODORO BORGES, TRIBUNAL PLENO, Julgado em 25/02/2016, Publicado no DJE
04/03/2016).”
Tem-se como apontamentos conclusivos: 1º)
não há na LEI que reestrutura
o Fundo de Desenvolvimento do Sistema de Pessoal – FUNDESP a previsão de que haveria receita proveniente de porcentagem
incidente sobre os valores consignados em folha de pagamento a favor de
entidade sindical; 2º) o fundo sendo público
descarta a possibilidade de conceituação do valor cobrado como tarifa, já que
não é adimplemento feito em benefício de particular; 3º) será considerando o valor tributado
proveniente de uma possível taxa, já que também não pode ser definido como
imposto; 4º) pela simples leitura dos textos legais existentes se pode
chegar à conclusão de que não há qualquer previsão em LEI quanto ao pagamento
de taxa de serviço estadual por entidade sindical quando o registro em folha de
pagamento de consignação em seu favor pela Administração Pública, mas apenas e
tão somente em DECRETO; 5º) o princípio da
reserva legal foi afrontado, sendo assim, é possível a declaração de
ilegalidade e da inconstitucionalidade da alínea B do inciso III do artigo § 1º do Decreto n.º 691/2016. Existe uma ampla gama de decisões do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso
sobre a procedência da alegação da necessidade de observância de tal preceito
constitucional; 6º) existe a previsão legal de que o registro de “de documento e papéis nas repartições estaduais, a requerimento da parte
interessada” seria taxado, e da probabilidade de que o registro de consignação
na folha de pagamento em benefício de entidade sindical seria definido como
tal. Porém não temos de que tal valor não seria o mesmo estipulado no Decreto
691/16, e principalmente, de que a pessoa jurídica de direito privado definida
como Administradora é à quem cabe realizar o serviço de processamento da
consignação não é a beneficiária do pagamento da suposta taxa, conforme o
artigo 11 do Decreto 691/16. Assim sendo, não há contraprestação útil do Estado
para que o mesmo seja beneficiário de taxa, conforme leitura decisões do Egrégio
Tribunal de Justiça de Mato Grosso.
Bruno Boaventura
Advogado.
Especialista em Direito Público. Mestre em Política Social pela UFMT. Blog: www.bboaventura.blogspot.com. Youtube: Boaventuraadv. Facebook: https://www.facebook.com/Boaventuraadv/ Site: https://boaventuraadv.com.br
[1] “DECRETO
Nº 691, DE 12 DE SETEMBRO DE 2016. Disciplina as consignações em folha de pagamento no
âmbito da Administração Pública Direta, Autárquica e Fundacional do Poder
Executivo do Estado de Mato Grosso, e dá outras providências. O GOVERNADOR DO ESTADO DE MATO
GROSSO,
no uso das atribuições que lhe confere o art. 66, incisos III e V, da
Constituição Estadual, tendo em vista o que consta no Processo nº 400753/2016,
e (...)
Art.
21 O repasse das
consignações será efetuado no vigésimo dia subsequente ao término do pagamento
da respectiva folha. § 1º No ato do
repasse dos valores relativos às consignações, será descontado do montante
consignado o percentual destinado ao Fundo de Desenvolvimento do Sistema de
Pessoal - FUNDESP, da seguinte forma: I - 5% (cinco por cento) do montante
consignado para as seguintes Consignatárias, nos termos da Lei Complementar nº
221/2005: a) entidades de previdência privada; b) seguradoras do ramo de vida.
II - 3% (três por cento) do montante consignado para as seguintes
Consignatárias: a) entidades de classe, exceto na modalidade mensalidade; b)
cooperativas; c) instituições financeiras; d) entidades administradoras de
cartão de crédito. III - 1% (um por
cento) do montante consignado para as seguintes Consignatárias, na modalidade
mensalidade: a) associação; b) sindicato.”
[2] “Art. 66 Compete
privativamente ao Governador do Estado: (...) II - sancionar, promulgar e fazer
publicar as leis, expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução; (...) IV - dispor sobre a organização e
funcionamento da Administração do Estado, na
forma da lei; (Grifos nossos).”
[3] Art. 3º Constituirão receita do FUNDESP:
I
- recolhimento mensal, na base de 5% (cinco por cento) do total das
consignações em folha de pagamento, em favor das companhias de seguros e de
entidades de previdência privada;
II
- dotações orçamentárias próprias;
III
- subvenções e transferências de órgãos municipais, estaduais, regionais e
federais;
IV
- receitas oriundas de taxas de inscrição em concursos;
V
- receitas oriundas de taxas de reprodução de documentos que compõem o acervo
do arquivo público de Mato Grosso;
VI
- receitas oriundas de promoções dinamizadoras na área de pessoal;
VII - receitas oriundas dos descontos de faltas injustificadas no serviço público;
VII - receitas oriundas dos descontos de faltas injustificadas no serviço público;
VIII
- alienação de papéis e mobiliários inservíveis;
IX - transferências à conta do orçamento do Estado;
IX - transferências à conta do orçamento do Estado;
X
- doações de pessoas jurídicas de direito público e privado, nacionais ou
internacionais;
XI
- rendas provenientes da aplicação de recursos;
XII
- receitas decorrentes de locação de imóveis públicos;
XIII - receitas decorrentes de convênios ou acordos de cooperação financeira com entidades públicas ou privadas.”
XIII - receitas decorrentes de convênios ou acordos de cooperação financeira com entidades públicas ou privadas.”
[4] Art. 65 Salvo
por imposição legal, ou mandado judicial, nenhum desconto incidirá sobre a
remuneração ou provento.
§ 1° Mediante
autorização do servidor poderá haver consignação em folha de pagamento a favor
de terceiros, ou seja, instituições de previdências, associações, sindicatos,
pecúlio, seguros e os demais na forma definida em regulamento instituído pelas
associações e sindicatos dos servidores.”
[5] “Art. 5 — 1. As organizações de empregados públicos
gozarão de completa independência a respeito das autoridades públicas. 2. As
organizações de empregados públicos gozarão de adequada proteção contra todo
ato de ingerência de uma autoridade pública na sua constituição, funcionamento
ou administração. 3. Serão considerados atos de ingerência para os efeitos
deste artigo principalmente os destinados a fomentar a constituição de
organizações de empregados públicos dominadas pela autoridade pública, ou a
sustentar economicamente, ou de outra forma, organizações de empregados
públicos com o objetivo de colocar estas organizações sob o controle da
autoridade pública.”
[6] “Art. 145. A
União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os
seguintes tributos: (...) II - taxas, em
razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou
potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao
contribuinte ou postos a sua disposição;”
[7] “Art. 150 Sem
prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado ao Estado e
aos Municípios: I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;”
[8] “Art. 5º Os
tributos são impostos, taxas e contribuições de melhoria.
Art. 9º É vedado à
União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:I -
instituir ou majorar tributos sem que a lei o estabeleça, ressalvado, quanto à
majoração, o disposto nos artigos 21, 26 e 65;”
[9] “Artigo 5º
- As taxas estaduais são as seguintes: I – Taxa Judiciária; II – Taxa
de Serviços Estaduais.”
[10] “Artigo 171 –
A Taxa de Serviços Estaduais tem como fatos geradores a realização dos atos e a
prestação dos serviços constantes da Tabela, Anexo II, e será cobrada de acordo
com os valores atribuídos as respectivas incidências.
Artigo 173 –
Não são tributados com a Taxa de Serviços Estaduais os atos e serviços
executados por repartições públicas ou estaduais que não estejam expressamente
nominados em qualquer dos itens da Tabela, Anexo II.”
[11] Artigo 2º - São tributos de competência do Estado: I –
Impostos: a) Sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias (I.C.M.) b)
Sobre a Transmissão de Bens Imóveis e de Direitos à Eles Relativos (I.T.B.I.);
II – Taxas: a – De Serviços Estaduais; b – De
Segurança Pública; c – Judiciária. (...) Artigo 90 – A Taxa de Serviços
Estaduais é devida pela utilização efetiva ou potencial de serviços específicos
e divisíveis prestados pelo Estado ou postos à disposição dos
contribuintes, na forma estabelecida no Regulamento. § 1º A Taxa de Serviços
Estaduais – TSE será exigida, inclusive, pela expedição, fornecimento e/ou
processamento de documentos pela Fazenda Pública Estadual, nas seguintes
hipóteses:
I – certidões relativas à existência ou não de débitos pertinentes a tributos estaduais ou outras certidões;
II – documento de arrecadação utilizado para recolhimento de tributos estaduais, bem como da contribuição ao Fundo Estadual de Transporte e Habitação – FETHAB; .(Declarada a Inconstitucionalidade da primeira parte do inc. II , do § 1º do art. 90, conforme decisão proferida na ADI nº 51410/2015, cujo acórdão está disponibilizado no DJ-e nº 9.728 de 03/03/2016)
III – documento fiscal.
I – certidões relativas à existência ou não de débitos pertinentes a tributos estaduais ou outras certidões;
II – documento de arrecadação utilizado para recolhimento de tributos estaduais, bem como da contribuição ao Fundo Estadual de Transporte e Habitação – FETHAB; .(Declarada a Inconstitucionalidade da primeira parte do inc. II , do § 1º do art. 90, conforme decisão proferida na ADI nº 51410/2015, cujo acórdão está disponibilizado no DJ-e nº 9.728 de 03/03/2016)
III – documento fiscal.
[12] Art. 405 A Taxa de Serviços Estaduais incide sobre a
realização dos atos e a prestação dos serviços constantes da Tabela, anexo V, e
será cobrada de acordo com os valores atribuídos às respectivas incidências. §
1º A Taxa de Serviços Estaduais - TSE será exigida, inclusive, pela expedição,
fornecimento e/ou processamento de documentos pela Fazenda Pública Estadual,
nas seguintes hipóteses: (Acrescentado
pelo Dec. 5.957/05) I - certidões relativas à existência ou não de débitos
pertinentes a tributos estaduais ou outras certidões; II - documento de
arrecadação utilizado para recolhimento de tributos estaduais, bem como da
contribuição ao Fundo Estadual de Transporte e Habitação - FETHAB;
III - documento fiscal.
III - documento fiscal.
[13] Art. 11 É de responsabilidade da
Administradora: I - manter atualizadas ferramentas para o processamento de
dados, controle e gestão das consignações facultativas em folha de pagamento;
II - realizar o cadastro e adesão do Consignante; III - realizar o controle e
conciliação das parcelas consignadas; IV - realizar intercâmbio de dados e
arquivos com as Consignatárias; V - disponibilizar ao Consignante informações
gerenciais sobre as Consignações; VI - cadastrar diferentes perfis de acesso, a
ser definido em norma complementar; VII - disponibilizar consulta das
consignações contratadas; VIII - manter atualizadas informações sobre endereço
e contato com as consignatárias; IX - disponibilizar consulta de margem; X - disponibilizar
consulta de taxas de juros praticados pelos bancos para obtenção de
empréstimos; XI - disponibilizar simulador de empréstimo e reserva de margem;
XII - firmar contrato ou documento equivalente com as Consignatárias; XIII -
observar a legislação pertinente no que se refere aos aspectos técnicos e à
proteção da confidencialidade dos dados; XIV - dar suporte técnico e
operacional e atendimento ao Consignante e Consignatárias
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