Você já ouviu falar no projeto de revitalização do córrego Gumitá ? Não ? Vou lhe falar um pouco sobre ele. Nos anos 80, Cuiabá vivia uma expansão dos seus limites urbanos. Líderes comunitários enfrentavam todos e tudo como em um êxodo pelo deserto do direito social da moradia.
Um destes limites era no que é hoje a Morado do Ouro, onde pessoas procuravam estabelecer moradias para suas famílias. Depois, veio a regularização fundiária feita pela Cohab conjuntamente com o Intermat, que comprovam, através da titulação e/ou escrituração, a legalidade da construção das casas.
Em torno do córrego do Gumitá, vivem hoje cerca de 400 famílias, e poucas delas estão na chamada Área de Preservação Permanente (APP). Porém, todas elas estão abrangidas e ao mesmo tempo excluídas no chamado projeto de revitalização. Explico esta aparente antinomia, pois ao mesmo tempo que toda a área das moradias será afetada pelo projeto, todas as famílias serão desapropriadas ou despejadas.
A revitalização não será para os atuais moradores, deverá ser para os futuros moradores do condomínio de luxo ainda a ser concluído. Ao lado do córrego o que será construído são vias de acesso, e não moradias, será um trânsito tão intenso que sufocará até mesmo as plantas.
A nova vida que se dará ao entorno do córrego trará morte aos atuais moradores. Tiro este raciocínio de um depoimento de um morador. Disse-me ele com o jeito cuiabano de falar: "Olha, tem gente que não vão agüentar mudar, morou a vida toda aqui, se mudar vai morrer."
Existem famílias que já estão no local há três gerações. A grande questão é que a Prefeitura não presta as devidas informações aos moradores. Até mesmo em uma recente reunião não tinha fornecido às Associações de Moradores de todos os bairros atingidos sequer a cópia do projeto de revitalização, e o esclarecimento quanto a avaliação imobiliária para o pagamento da indenização.
A desapropriação realmente poderia acontecer, acaso exista um interesse público e não tão somente privado. Os moradores terão que re-iniciar suas vidas em outro local, mas isto só pode acontecer mediante uma indenização justa que garanta um devido pagamento de cada metro quadrado e de cada pedaço da vida destes moradores que estará morrendo. Os moradores do entorno do córrego estão clamando por esclarecimento. Não podem ser tratados com a estratégia da desinformação para que a Prefeitura possa apressadamente pagar um valor que não condiz com o que a Lei determina.
Infelizmente a vida que quer ser renovada no Gumitá não será para quem construiu toda a sua vida naquele local, ao contrário os moradores deverão ser empurrados para bairros periféricos aonde cada vez mais a morte acontece.
BRUNO J. R. BOAVENTURA é advogado e assessor jurídico da Associação dos Moradores do Bairro Centro América.
2 comentários:
Escrevi em comentário ao olhar direto e gostaria de enaltecer sua atuação. Tive o prazer de conhecê-lo na reunião realizada por Joao Celestino em que ele tencionava ser candidato. Seu leitor assíduo, incentivador de sua postura e futuramente orgulhoso em ser seu colega,
Bruno Álvares
Falo em defesa do futuro colega autor do brilhante artigo que em minha, quem saiba ínfima opinião, proferida por este acadêmico de direito da UFMT que conhece alguns moradores da região do córrego do Gumitá, exerce proeminente atuação em sua promissora carreira como advogado ao fomentar valorosas discussões no tocante à defesa da classe e, neste momento, consciencioso do imprescindível papel social de sua profissão, fala em nome daqueles cujos recursos são infinitamente limitados ante ao poderio do “interesse público” – por vezes confundindo com interesse político recorrentemente inconseqüente.
Entrementes até em grau concordado o subscritor de um comentário e severas críticas tenha feito, e mais, tenha comparado a revitalização do nosso, não menos importante, córrego do Gumitá a do rio Tâmisa, que corta a Cidade de Londres praticamente ao meio, cuja área urbana talvez seja 20 vezes maior que a de Cuiabá – e com certeza quem a sua margem detêm propriedades ou fixou residência não fora desapropriado – ao o que se pretende fazer com a população que reside àquelas margens! Discordo e lamento a reação negativa ao tão relevante preocupação.
Ótima lembrança Bruno Boaventura, temos de ficar atentos para que sob a desculpa do interesse público toda aquela gente venha ser desapropriada e conduzida sabe-se lá a qual lugar, gerando desabrigados, condenando indivíduos a viver à margem da sociedade e gerando mais criminalidade.
A revitalização do córrego e necessária, mas garantir a existência digna daquelas pessoas imprescindível!
Boa Tarde amigo,
Primeiramente, queria lhe dar os parabéns pelo artigo.
Em relação ao projeto de revitalização do córrego gumitá, concordo plenamente com todos os aspectos que você levantou. Tenho uma área na região do tancredo neves que irá provavelmente ser afetado pelo projeto. Enfim, percebi que o seu post foi há um bom tempo atrás, e gostaria de saber se você tem alguma informação sobre a viabilidade desse projeto? Ele realmente ocorrerá? Quando? Também sou advogado e pretendo buscar na justiça meus direitos e o que é devido acerca do meu direito de propriedade.
Att.
Diego Barros
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