quarta-feira, 25 de agosto de 2021

A imunidade tributária do clube recreativo do Sindicato a partir do RE 611510

 

 

O presente texto trata de decisão administrativa de indeferimento da imunidade e a isenção tratadas respectivamente na Constituição Federal e na Legislação Ordinária, já que essas não beneficiam os imóveis de entidades sindicais utilizados para a finalidade de serem clubes recreativos, pois tal uso não seria de finalidade essencial da entidade sindical.

Tal pretensa interpretação se baseia na assertiva de que ao ser utilizado o imóvel da entidade sindical para a finalidade de clube recreativo perderia a imunidade pelo chamado desvio de finalidade da própria atividade sindical. Porém, temos que pelo julgamento do RE 611510 pelo Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, conforme a Excelentíssima Ministra Rosa Weber asseverou no voto vencedor de que: “a exegese literal e restritiva da imunidade, não merece acolhida, haja vista desconsiderarem a sua finalidade e, além dela, a firme jurisprudência desta Corte.”

O clube recreativo em questão serve aos Sindicalizados para área de confraternização, mas também para que haja reuniões, palestras, seminários e até mesmo assembleias dos Sindicalizados. É comum que os trabalhadores que residem no interior do estado, o utilizem como possibilidade de hospedagem seja por motivo de trabalho, saúde ou lazer. O hotel não tem custo para os associados do sindicato e seus dependentes.

 Sendo ainda importante ressaltar de que o Estatuto de um entidade sindical: I) não contempla dispositivo que permita a utilização das áreas e recreação por não sindicalizado; II) não consta dispositivo que permita a venda de ingressos a terceiros (visitantes), para utilização das instalações do Clube; III) não consta nos registros contábeis nem nas declarações de renda pagamento de remuneração a diretores; IV) não permite a remuneração de seus diretores, não distribui lucros e toda a receita que recebe de seus associados e de terceiros por uso de área de lazer, é revertida diretamente para finalidades sociais, com o que os sindicalizados se beneficiam.

 Além de a entidade manter escrituração regular, nos termos da lei.

 O objetivo de um Clube Social é permitir que os Sindicalizados se beneficiem de sua estrutura e de seu patrimônio, desfrutando das condições ofertadas por sua sede para convívio, o desenvolvimento de atividades de natureza social esportiva, cultural, de lazer, mas também que atenda a possibilidade de realização dos atos internos relacionados a democracia interna do Sindicato.

 

O certo é que a finalidade também recreativa não retira do patrimônio do Sindicato a sua finalidade, pois se deve interpretar de modo que: “a exigência de vinculação do patrimônio não se confunde com afetação direta e exclusiva a tais finalidades”, temos assim pelo julgamento do RE 611510 pelo Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral.

 Conforme o professor Ives Grandra da Silva Martins já asseverou em estudo pretérito: somente com a atividades de concorrência desleal que a tributação se justifica, vejamos:

 

O que vale dizer que apenas se as atividades puderem gerar concorrência desleal ou as finalidades das entidades imunes não forem beneficiadas por tais resultados é que a tributação se justifica, visto que, de rigor, tais atividades refogem ao campo de proteção tributária que o legislador supremo objetivou ofertar a essas finalidades da sociedade. Pela mesma linha de raciocínio, os aluguéis de imóveis de que essas entidades sejam proprietárias são imunes, pois não afetam a livre concorrência, sobre serem rendimentos de capital destinados a permitir o atendimento dos objetivos sociais das instituições consideradas fundamentais para o atendimento complementar das atividades estatais. À evidência, os rendimentos de atividades sujeitas ao princípio da livre concorrência não podem ser alcançados pela desoneração sob risco de criar privilégio inadmissível no direito econômico constitucional e propiciar dominação de mercados ou eliminação da concorrência. Tais rendimentos, portanto, não são imunes, devendo ser tributados” [1].

 A associação sindical sem fins lucrativos, de trabalhadores pertencentes a uma mesma categoria profissional, que tem por finalidade de prestar assistência integral resguardando os interesses econômicos e laborais, bem como a representatividade e a defesa desta categoria de trabalhadores. A entidade sindical representante de uma classe de trabalhadores, com personalidade jurídica de direito privado, sem fins lucrativos ou econômicos, cuja finalidade precípua é: visar melhorias nas condições de vida e de trabalho de seus representados, defender a independência e autonomia da representação sindical e atuar na manutenção e na defesa das instituições democráticas brasileiras nos termos do seu Estatuto Social.

Diante dos fatos narrados, fica evidente o direito do artigo 150, VI, alínea “c” da Constituição Federal c/c Art. 9º, inciso IV, alínea “C” do CTN, ao consignarem que o afastamento dos impostos das entidades sindicais dos trabalhadores, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei.

Verifica-se pelo próprio Estatuto de que um Sindicato: a) aplica integralmente seus recursos dentro do País; b) não faz distribuição de lucros e c) mantém escrituração contábil válida, cumprindo integralmente os requisitos estabelecidos no art. 14 do CTN.

 O tributarista, Dr. Luiz Fernando de Mello diz que o elemento teleológico, que justifica o comando imunizante às entidades sindicais dos trabalhadores exsurge da “validade na liberdade de organização, associação, pensamento e expressão previstas no artigo 5° da Constituição Federal, sendo fundamental para o Estado de Direito”.[2]

 Em reforço e com fulcro ao presente tema, no dia 02 de março de 2017, o Supremo Tribunal Federal (STF), julgou a ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) nº 2028 e o Recurso Extraordinário (RE) 566.622[3], que tratam da imunidade tributária concedida as entidades sem fins lucrativos, previstas no artigo 195, parágrafo 7º da Constituição Federal e nos artigos 9º e 14 do Código Tributário Nacional (CTN), onde ficou pacificada a tese aqui defendida, no que diz respeito aos critérios que as entidades do Terceiro Setor devem cumprir para obtenção do benefício da imunidade tributária.

 Na decisão prolatada o STF declarou inconstitucional, a utilização de lei ordinária na previsão de requisitos e exigências para o exercício de imunidade tributária por parte das entidades do terceiro setor, contida no art. 195, parágrafo 7º da Constituição, afirmando o que a doutrina majoritária já defendia nesse particular, ratificando o que expressamente já determinava a CF/88 no Art. 146.

Segundo a decisão do STF, a lei capaz de determinar tais requisitos é o Código Tributário Nacional, que foi recepcionado pela carta magna com status de lei complementar.

Sendo assim, o STF determinou que para as imunidades tributárias serem reconhecidas, lei ordinária não pode estabelecer requisitos e exigências, tais como certificado de entidade beneficente ou filantrópica e nem de títulos de utilidade pública.

 Destarte, de acordo com a decisão mencionada, o Supremo determinou que os únicos requisitos e exigências para obtenção da imunidade tributária por parte das entidades sem fins lucrativos, a exemplo da cota patronal do INSS, são os estabelecidos no art. 14 e seus respectivos incisos do Código Tributário Nacional, por se tratar da lei complementar recepcionada pela Constituição Federal, e que devem ser cumpridos em sua totalidade por todas as entidades do Terceiro Setor.

Por oportuno, a imunidade tributária conferida pela CF/88 e pelo Código Tributário Nacional, abrange aquelas instituições do Terceiro Setor, que não possuem fins lucrativos e que legalmente a estas entidades, são vedadas a cobrança de impostos e contribuições sociais sobre a renda, o patrimônio e os serviços prestados, nas esferas federal, estadual e municipal.

Nesse mesmo sentindo de garantir a concreção da imunidade tributária, também é o entendimento do Supremo Tribunal Federal de queo afastamento da imunidade só pode ocorrer mediante a constituição de prova em contrário produzida pela administração tributária, uma vez que as entidades imunes gozam da presunção de que seu patrimônio, renda e serviços são destinados às suas finalidades essenciais”, vejamos:

 

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. MATÉRIA AFETADA PARA JULGAMENTO NO TRIBUNAL PLENO PELA SEGUNDA TURMA. ARTIGOS 11, I, PARÁGRAFO ÚNICO C/C 22, PARÁGRAFO ÚNICO, “B”, AMBOS DO RISTF. DIREITO TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE RECÍPROCA. ART. 150, VI, “A”, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. CAIXA DE ASSISTÊNCIA DOS ADVOGADOS. 1. A questão referente à imunidade aplicável às entidades assistenciais (CF, 150, VI, “c”) é impassível de cognição na via do recurso extraordinário, quando não há apreciação pelas instâncias ordinárias, nem foram interpostos embargos declaratórios para fins de prequestionamento. Súmulas 282 e 356 do STF. 2. É pacífico o entendimento de que a imunidade tributária gozada pela Ordem dos Advogados do Brasil é da espécie recíproca (CF, 150, VI, “a”), na medida em que a OAB desempenha atividade própria de Estado. 3. A OAB não é uma entidade da Administração Indireta, tal como as autarquias, porquanto não se sujeita a controle hierárquico ou ministerial da Administração Pública, nem a qualquer das suas partes está vinculada. ADI 3.026, de relatoria do Ministro Eros Grau, DJ 29.09.2006. 4. Na esteira da jurisprudência do STF, considera-se que a Ordem dos Advogados possui finalidades institucionais e corporativas, além disso ambas devem receber o mesmo tratamento de direito público. 5. As Caixas de Assistências dos Advogados prestam serviço público delegado, possuem status jurídico de ente público e não exploram atividades econômicas em sentido estrito com intuito lucrativo. 6. A Caixa de Assistência dos Advogados de Minas Gerais encontra-se tutelada pela imunidade recíproca prevista no art. 150, VI, “a”, do Texto Constitucional, tendo em vista a impossibilidade de se conceder tratamento tributário diferenciado a órgãos da OAB, de acordo com as finalidades que lhe são atribuídas por lei. 7. Recurso extraordinário parcialmente conhecido a que se nega provimento.

(RE 405267, Relator(a):  Min. EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 06/09/2018, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-222 DIVULG 17-10-2018 PUBLIC 18-10-2018)

 

Trata-se de agravo contra decisão que negou seguimento ao recurso extraordinário interposto em face de decisão que extinguiu a execução fiscal promovida pelo Município de São Paulo, tendo em vista que não houve a demonstração de que os bens imunes do sindicato não estariam relacionados com suas atividades essenciais. Consignou-se, ainda, que seria inviável a cobrança de taxa de conservação, limpeza e de combate de sinistro, visto que teria a mesma base de cálculo do IPTU. No RE, fundado no art. 102, III, a, da Constituição Federal, alegou-se, em suma, ofensa ao art. 150, VI, c, da mesma Carta, sob o argumento de que a mera condição de entidade sindical não seria suficiente para lhe conferir a imunidade tributária, pois não se pode presumir que todos os seus bens estariam destinados aos seus objetivos essenciais. Ademais, sustentou-se que o sindicato não teria apresentado documentos suficientes para cumprir os requisitos do art. 14 do Código Tributário Nacional. A pretensão recursal não merece acolhida. Isso porque, para se chegar à conclusão contrária à adotada pelo Juízo de origem, notadamente quanto à constatação do preenchimento dos requisitos legais necessários ao reconhecimento da imunidade tributária em questão, seria necessário o reexame do conjunto fático-probatório constante dos autos, o que atrai a incidência da Súmula 279/STF, bem como seria imprescindível a interpretação da legislação infraconstitucional aplicável à espécie (Código Tributário Nacional), sendo certo que eventual ofensa à Constituição Federal seria indireta. Incabível, portanto, o recurso extraordinário. Nesse sentido, destaco o julgamento do ARE 985.156-AgR/RJ, de relatoria do Ministro Luiz Fux, cuja ementa transcrevo a seguir: “AGRAVO INTERNO NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. TRIBUTÁRIO. IPTU. IMUNIDADE. ART. 150, VI, C, DA CF. ENTIDADE EDUCACIONAL OU DE ASSISTÊNCIA SOCIAL. CARACTERIZAÇÃO. ATENDIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. DESTINAÇÃO DO PATRIMÔNIO, RENDA OU SERVIÇOS. RELAÇÃO COM AS FINALIDADES ESSENCIAIS DO ENTE IMUNE. ART. 150, § 4º, DA CF. ANÁLISE DE NORMA INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA REFLEXA. INCURCIONAMENTO NO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. SÚMULA Nº 279 DO STF. PRESUNÇÃO DE DESTINAÇÃO DO PATRIMÔNIO, DA RENDA E DOS SERVIÇOS ÀS FINALIDADES ESSENCIAIS DAS ENTIDADES IMUNES. DEVER DO FISCO DE PROVAR EVENTUAL DESVIO DE FINALIDADE. REITERADA REJEIÇÃO DOS ARGUMENTOS EXPENDIDOS PELA PARTE NAS SEDES RECURSAIS ANTERIORES. MANIFESTO INTUITO PROTELATÓRIO. APLICAÇÃO DA MULTA DO ARTIGO 1.021, § 4º, DO CPC. AGRAVO INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. APLICAÇÃO DA NOVA SUCUMBÊNCIA RECURSAL. ARTIGO 85, §§ 2º, 3º E 11, DO CPC/2015. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO” (grifei). Além disso, cumpre ressaltar que esta Corte possui entendimento firmado no sentido de que o afastamento da imunidade só pode ocorrer mediante a constituição de prova em contrário produzida pela administração tributária, uma vez que as entidades imunes gozam da presunção de que seu patrimônio, renda e serviços são destinados às suas finalidades essenciais. Nesse sentido, transcrevo ementas de julgados de ambas as Turmas deste Tribunal: “AGRAVO INTERNO NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. TRIBUTÁRIO. IPTU. IMUNIDADE. ART. 150, VI, C, DA CF. ENTIDADE EDUCACIONAL OU DE ASSISTÊNCIA SOCIAL. CARACTERIZAÇÃO. ATENDIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. DESTINAÇÃO DO PATRIMÔNIO, RENDA OU SERVIÇOS. RELAÇÃO COM AS FINALIDADES ESSENCIAIS DO ENTE IMUNE. ART. 150, § 4º, DA CF. ANÁLISE DE NORMA INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA REFLEXA. INCURCIONAMENTO NO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. SÚMULA Nº 279 DO STF. PRESUNÇÃO DE DESTINAÇÃO DO PATRIMÔNIO, DA RENDA E DOS SERVIÇOS ÀS FINALIDADES ESSENCIAIS DAS ENTIDADES IMUNES. DEVER DO FISCO DE PROVAR EVENTUAL DESVIO DE FINALIDADE. REITERADA REJEIÇÃO DOS ARGUMENTOS EXPENDIDOS PELA PARTE NAS SEDES RECURSAIS ANTERIORES. AGRAVO INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. APLICAÇÃO DA NOVA SUCUMBÊNCIA RECURSAL. ARTIGO 85, §§ 8º E 11, DO CPC/2015. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO” (ARE 977.799-AgR/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, grifei). “Segundo agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Imunidade. Artigo 150, VI, c, CF. ITBI. Corte de competência. Destinação do imóvel adquirido. Presunção que milita em favor da entidade imune. Ônus da prova. Inversão. 1. No caso do ITBI, a destinação do imóvel às finalidades essenciais da entidade deve ser pressuposta, sob pena de não haver imunidade para esse tributo. 2. Caso já tenha sido deferido o status de imune ao contribuinte, as presunções sobre o enquadramento originalmente conferido ao imóvel devem militar a seu favor. O afastamento dessa imunidade só pode ocorrer mediante a constituição de prova em contrário produzida pela administração tributária. 3. Agravo regimental não provido” (ARE 759.601-AgR-segundo/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, Segunda Turma, grifei). Com essa mesma orientação, cito as seguintes decisões, entre outras: ARE 985.156-AgR/RJ e ARE 823.685/SP, Rel. Min. Luiz Fux; RE 385.091/DF, ARE 758.289-AgR/RJ e AI 746.263-AgR-ED/MG, Rel. Min. Dias Toffoli; ARE 689.175-AgR/RS, Rel. Min. Roberto Barroso; ARE 987.420/SP e ARE 1.078.205/SP, de minha relatoria. Isso posto, nego seguimento ao recurso (art. 21, § 1°, do RISTF). Publique-se. Brasília, 11 de dezembro de 2018. Ministro Ricardo Lewandowski Relator

(ARE 1174794, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, julgado em 11/12/2018, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-268 DIVULG 13/12/2018 PUBLIC 14/12/2018) (destaques nossos)

 

Sendo que o próprio Supremo Tribunal Federal já asseverou também de que a “utilização do imóvel para atividade de lazer e recreação não configura desvio de finalidade com relação aos objetivos da Fundação caracterizada como entidade de assistência social”, vejamos:

 

EMENTA Imunidade tributária. IPTU. Finalidade do bem. 1. A utilização do imóvel para atividade de lazer e recreação não configura desvio de finalidade com relação aos objetivos da Fundação caracterizada como entidade de assistência social. 2. A decisão que afasta o desvio de finalidade para o fim de assegurar a imunidade tributária com base no reconhecimento de que a atividade de recreação e lazer está no alcance dos objetivos da Fundação não agride o art. 150, § 4º, inciso VI, da Constituição Federal. 3. Recurso extraordinário conhecido, mas desprovido.

(RE 236174, Relator(a): MENEZES DIREITO, Primeira Turma, julgado em 02/09/2008, DJe-202  DIVULG 23-10-2008  PUBLIC 24-10-2008 EMENT VOL-02338-04  PP-00823 RTJ VOL-00207-03 PP-01192 RT v. 98, n. 879, 2009, p. 180-182 RF v. 104, n. 400, 2008, p. 347-349 LEXSTF v. 31, n. 361, 2009, p. 172-176)

 Foi com base nessa premissa, a Suprema Corte editou a Súmula Vinculante 52, que reconhece a imunidade até mesmo de imóveis alugados a terceiros, sempre que o valor dos aluguéis seja aplicado nas atividades essenciais da entidade imune:“Ainda quando alugado a terceiros, permanece imune ao IPTU o imóvel pertencente a qualquer das entidades referidas pelo art. 150, VI, c, da CF, desde que o valor dos aluguéis seja aplicado nas atividades para as quais tais entidades foram constituídas.”

Temos assim que sistematicamente houve derrotas desta vertente, de entendimento mais restritivo, que procura identificar uma relação direta entre a atividade realizada e os fins ou finalidades da entidade em foco. Conforme ensinado por Aldemario Araujo Castro[4], Procurador da Fazenda Nacional, o que ocorre com as decisões do Supremo Tribunal Federal sempre foi a defesa do posicionamento mais aberto e flexível, que busca um vínculo indireto, centrado na destinação dos valores arrecadados, entre a atividade desenvolvida e as finalidades essenciais da entidade. Neste rumo, considerando a ausência de objetivos lucrativos e aplicações em outros fins, os recursos arrecadados financiam a manutenção e o desenvolvimento das finalidades essenciais. Com acerto, a evolução da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal aponta inequivocamente neste sentido, vejamos:

 (a)               imunidade ao ICMS quando da entrada de mercadoria importada destinada a integrar o ativo fixo (portanto, o patrimônio da entidade) (RE 203.755);

(b)              imunidade ao Imposto de Importação e ao IPI na importação de “bolsas para coleta de sangue” (a serem utilizadas na prestação de serviços específicos da entidade) (RE 243.807);

(c)               imunidade ao ICMS na venda de mercadorias (considerando que os valores obtidos serão destinados às finalidades essenciais da entidade) (Embargos de Divergência no RE 210.251);

(d)              imunidade ao IPTU no caso de aluguel do imóvel para terceiros (considerando que os valores auferidos serão utilizados nas finalidades essenciais da entidade) (RE 237.718 e Súmula STF n. 724);

(e)               e) imunidade ao ISS no caso de prestação de serviços (considerando que os valores obtidos serão destinados às finalidades essenciais da entidade) (RE 116.188, RE 144.900 e RE 218.503).

Sendo que recentemente, tal sentido da norma tributária imunizante foi ratificado pelo julgamento do RE 611510 pelo Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, vejamos a respectiva Ementa:

 

EMENTA RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. DIREITO TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE. ART. 150, VI, “c”, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. ENTIDADES SINDICAIS, PARTIDOS POLÍTICOS, INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO E DE ASSISTÊNCIA SOCIAL SEM FINS LUCRATIVOS. IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES FINANCEIRAS - IOF. 1. Segundo a pacífica jurisprudência desta Suprema Corte, a imunidade tributária prevista no art. 150, VI, “c”, da Constituição da República alcança o Imposto sobre Operações Financeiras – IOF. 2. Os objetivos e valores perseguidos pela imunidade em foco sustentam o afastamento da incidência do IOF, pois a tributação das operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários das entidades ali referidas, terminaria por atingir seu patrimônio ou sua renda. 3. A exigência de vinculação do patrimônio, da renda e dos serviços com as finalidades essenciais da entidade imune, prevista no § 4º do artigo 150 da Constituição da República, não se confunde com afetação direta e exclusiva a tais finalidades. Entendimento subjacente à Súmula Vinculante 52. 4. Presume-se a vinculação, tendo em vista que impedidas, as entidades arroladas no art. 150, VI, “c”, da Carta Política, de distribuir qualquer parcela do seu patrimônio ou de suas rendas, sob pena de suspensão ou cancelamento do direito à imunidade (artigo 14, I, e § 1º, do Código Tributário Nacional). Para o reconhecimento da imunidade, basta que não seja provado desvio de finalidade, ônus que incumbe ao sujeito ativo da obrigação tributária. 5. Recurso extraordinário da União desprovido, com a fixação da seguinte tese: A imunidade assegurada pelo art. 150, VI, ‘c’, da Constituição da República aos partidos políticos, inclusive suas fundações, às entidades sindicais dos trabalhadores e às instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, que atendam aos requisitos da lei, alcança o IOF, inclusive o incidente sobre aplicações financeiras.

(RE 611510, Relator(a): ROSA WEBER, Tribunal Pleno, julgado em 13/04/2021, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-087  DIVULG 06-05-2021  PUBLIC 07-05-2021)

 Temos assim que pelo julgamento do RE 611510 pelo Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral que: I) A exigência de vinculação do patrimônio não se confunde com afetação direta e exclusiva a tais finalidades (item 3 da Ementa); II) presume-se a vinculação do patrimônio com as finalidades essenciais da entidade imune (item 4 da Ementa); IV) Para o reconhecimento da imunidade, basta que não seja provado desvio de finalidade (item 4 da Ementa); V) o ônus da prova do desvio de finalidade cabe ao sujeito ativo da obrigação tributária (item 4 da Ementa).

A Excelentíssima Ministra Rosa Weber asseverou no voto vencedor alguns pontos que devem ser considerados quanto ratio decidendi: A) a imunidade tributária da entidade sindical trata-se de projeção, no âmbito tributário, de direitos fundamentais dos cidadãos, nomeadamente dos seus direitos políticos, laborais, educacionais e assistenciais; B) a relevância é tal que a referida imunidade constitui cláusula  pétrea. Sequer o constituinte derivado pode alterá-la ou excepcioná-la,  como esta Corte reconheceu no célebre julgamento da ADI 939; C) a exegese literal e restritiva da  imunidade, não merece acolhida, haja vista desconsiderarem a sua finalidade e, além dela, a firme jurisprudência desta Corte; D) a imunidade das entidades sindicais dos trabalhadores, que também é uma inovação trazida pela Constituição vigente, almeja garantir o pleno exercício da liberdade de associação sindical (art. 8º, caput, da CF) e dos direitos individuais e coletivos dos trabalhadores, que são tutelados e reivindicados pelos sindicatos de suas categorias (art. 8º, III, da CF).

 Temos que pelo julgamento do RE 611510 pelo Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, conforme a Excelentíssima Ministra Rosa Weber asseverou no voto vencedor de que: “a exegese literal e restritiva da imunidade, não merece acolhida, haja vista desconsiderarem a sua finalidade e, além dela, a firme jurisprudência desta Corte.”

 O certo é que a finalidade também recreativa não retira do patrimônio do Sindicato a sua finalidade, pois se deve interpretar de modo que: “a exigência de vinculação do patrimônio não se confunde com afetação direta e exclusiva a tais finalidades”, temos assim pelo julgamento do RE 611510 pelo Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral.

 



[1] Pesquisas Tributárias, Nova Série, n. 4, Editora Revista dos Tribunais, 1998, p. 46-47).

 

[2] MELLO, Luís Fernandes Xavier Soares de, GUTIERREZ, Eduardo. Da cobrança do IPTU e a imunidade tributária dos sindicatos. PEIXOTO, Marcelo Magalhães (coord.). IPTU: aspectos jurídicos relevantes. São Paulo: Quartier Latin, 2002, p. 396

 

[3] IMUNIDADE – DISCIPLINA – LEI COMPLEMENTAR. Ante a Constituição Federal, que a todos indistintamente submete, a regência de imunidade faz-se mediante lei complementar. (RE 566622, Relator(a):  Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 23/02/2017, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-186 DIVULG 22-08-2017 PUBLIC 23-08-2017)

[4] In: CONDICIONAMENTO DAS IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS PRESENTE NA CLÁUSULA CONSTITUCIONAL DAS “FINALIDADES ESSENCIAIS, documento em anexo.

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